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sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Entrevista: Noemi Paymal, antropóloga francesa


Estilo Próprio conversou com a especialista na educação das crianças do Terceiro Milênio

Fernanda Zaffari
É voz corrente que as crianças de hoje são mais espertas. Na defesa desse argumento, muitos listam características apontando que os pequenos são hiperativos, autodidatas principalmente no que se refere à tecnologia, não aceitam ordens sem justificativas, mas enfrentam dificuldade em se concentrar, distraindo-se facilmente.
A antropóloga francesa Noemi Paymal, que esteve recentemente em Porto Alegre participando do Seminário Internacional Pare e Pense, dedica-se desde 2001 a estudar as crianças do Terceiro Milênio. Da lista acima, ela questiona a dificuldade de concentração:
– É uma criança mais madura, mais precoce, muito rápida e multilateral, que pode aprender várias coisas ao mesmo tempo – diz.
Com a experiência de mais de duas décadas de trabalho em países da América Latina, Noemi concluiu que as escolas nos moldes atuais não estão capacitadas para atender a uma geração com essas habilidades e comportamentos. Não é a única educadora de ofício a partilhar dessa visão, mas tem sua própria proposta de sistema para enfrentar a questão: a Pedagogia 3000.
Para definir as crianças alvo de sua filosofia de ensino, Noemi usa o termo Geração Índigo (termo utilizado pela primeira vez pela pesquisadora e metafísica americana Nancy Ann Tappe e apresentado internacionalmente por Lee Carroll e Jan Tober, americanos que escreveram o livro Crianças Índigo, já traduzido para o português). As "crianças índigo" teriam características físicas, psicológicas e espirituais diferentes das gerações anteriores.
Ingrid Cañete, psicóloga gaúcha especializada no tema e que trouxe Noemi pela primeira vez ao Estado, acrescenta:
– São crianças com capacidade para captar informações de diferentes dimensões de consciência, ao mesmo tempo e capacidade de fazer coisas diferentes, ao mesmo tempo, o que não pode ser confundido com distração ou déficit de atenção.
O termo "índigo" é uma referência à cor da aura (ou campo energético que circunda o corpo humano) dessas crianças. E é sobre esses elementos espirituais que recaem as mais duras críticas ao conceito. A espiritualidade implicaria em religiosidade, parte da forte polêmica entre educadores que questionam a falta de comprovação científica da teoria.
Noemi, antropóloga francesa que vive na Bolívia, não concorda. Diz não querer se limitar a rótulos e afirma que sua Pedagogia 3000 não é dirigida somente aos índigos, e que a discussão deveria centrar-se na necessidade, real, de mudanças na educação.
– É um falso problema para não entender a mudança que está acontecendo agora.
Estilo Próprio – O que esta geração de crianças tem de especial em relação às anteriores?
Noemi Paymal – As crianças nascidas depois dos anos 2000 têm uma nova maneira de aprender, de atuar, têm até uma nova estrutura cerebral que a educação atual já não satisfaz. É uma aceleração evolutiva rápida que surpreende não só educadores, mas médicos, psicólogos, pediatras. As crianças pequenas, numa proporção de 80%, não estão nos padrões pediátricos, psicológicos e educativos. Já existem luzes de alerta, como as crianças agressivas, o bullying, a depressão, as drogas, e os suicídios.
EP – Qual é a influência da grande quantidade de informação e da tecnologia nelas?
Paymal – Já são crianças digitais. A criança de agora, por natureza, pode projetar facilmente o futuro, o bem comum. É capaz de ver muitas soluções ao mesmo tempo, o que se chama de multiatenção e não déficit de atenção. O que é difícil para as crianças pequenas é ordenar. Elas possuem uma percepção muito mais ampla, por isso sofrem na escola.
EP – Qual é o papel dos pais na orientação dessas crianças?
Paymal – As crianças mudaram mais rápido dos que os pais, os professores e o sistema educacional. Um sociólogo no Equador comparou essas mudanças à descoberta do fogo e às grandes mudanças industriais. É obvio que os pais não tem culpa. Eles precisam entender que não se trata de uma criança louca, hiperativa. É apenas inquieta, que quer mais, necessitando trabalhar o corpo, o emocional, o cognitivo, o intuitivo, o ético, o espiritual, o estético criador, o social, o multicultural e o ecológico. A escola te dá o cognitivo. Se tens sorte, dá educação física e música.
EP – A Pedagogia 3000 foi estruturada para as crianças índigo?
Paymal - É para todas as crianças, caso contrário apenas seguiria uma moda. Se o meu filho é índigo e o teu não, começa uma divisão.
EP -–A crítica ao conceito de crianças índigo é que não existe comprovação científica, que envolve espiritualidade. Você concorda?
Paymal – Não. É científico. Basta ver qualquer estudo com crianças pequenas com um pediatra e um psicólogo e eles vão apontar as mudanças reais e atuais. Com este pretexto não vamos mudar a educação. Isso não é fé, é necessidade.
EP - Mas não é preciso acreditar que você vê a aura de uma pessoa, o seu campo energético, para entender os índigos?
Paymal – Não importa, é uma parte pequena do processo educativo. Se não quer aprender a parte intuitiva, existem outros níveis. É um falso problema para não entender a mudança de agora. Não vejo aura e trabalho dia e noite para mudar a educação.
EP – Qual a maior dificuldade que você enfrenta para a aplicação do sistema?
Paymal – Implica numa mudança de nós mesmos e isso dá medo. Requer uma mudança pessoal, íntima, de atitude de vida e de mais amor. Uma criança certa vez me disse: "Nós estaremos felizes, quando vocês, os adultos, estiverem felizes". Em outras palavras, esqueçam de nós e façam o seu trabalho.
EP – De que maneira prática pais e educadores podem modificar sua atuação?
Paymal – Há recomendações simples, como trabalhar a inteligência emocional, a autoestima. É preciso estimular o trabalho na terra, para não limitar as crianças à informática. Nada de castigo ou recompensa, porque isso é adestrar. Deve ser um processo com consciência, para que a criança entenda e seja corresponsável. Isso é a diferença entre adestrar e educar - gosto mais de usar o termo coaprender. A grande recomendação é que pais e professores relaxem, respirem fundo.
EP – No Brasil, um país com imensas diferenças sociais, a sua proposta de sistema de ensino poderia ajudar de que maneira?
Paymal – Isso é a cultura de paz e da pedagogia social, que no Brasil é avançada. É o único país que conheço com tamanha consciência.
EP – Como as novas configurações de família, pais divorciados, mães solteiras, pais do mesmo sexo, afetam as crianças de hoje?
Paymal – Há a família ampliada, que vem da noção da comunidade indígena. Se morre a mãe biológica, quem ajuda é uma tia, uma amiga, uma professora. As crianças estão atentas aos demais. A criança de agora tem uma grande capacidade de perceber quem é quem.

Fonte: http://www.clicrbs.com.br/especial/rs/donna/19,206,2926560,Entrevista-Noemi-Paymal-antropologa-francesa.html

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